domingo, 31 de janeiro de 2010

Domingo, sol, sal e água

Hoje decidi acabar o dia comigo própria, no meu espaço, no meu momento, depois de uma noite que já se previa forte e efectivamente foi.
Há quem tenha o seu momento zen a surfar, há quem vá correr para espantar os fantasmas. O meu momento zen é pegar no carro e ir até à praia. Fazer o caminho mais longo, por entre o verde e o castanho que aprendi a amar desde que para aqui vim viver, até chegar onde a luz do sol se reflecte na água das ondas gigantes, que os surfistas pacientes tentam apanhar.
Sentem-se vivos e eu cá fora também. O caminho desperta-me os sentidos ao som de uma qualquer música escolhida para me acompanhar, na cadência solitária das mudanças que vou fazendo subir e descer, enquanto faço as curvas apertadas dos montes e vales que ligam a minha casa às praias da Ericeira.
Ao chegar, avançei para o areal e ali fiquei a olhar as ondas, a inspirar a brisa e a sentir o sol que se punha ao longe. E a calma instalou-se, a mente esvaziou e o único som que assimilei foi o da rebentação das ondas nas rochas e o ladrar de um cão brincalhão que corria em busca do pau que o dono atirava. Gostava que o Tobi fosse menos obstinado para o trazer aqui, mas se o desgraçado se visse solto, depois era um caso sério para o apanhar.
Ontem, por entre um bocadinho de confidência em momento especial, a Rita partilhou comigo, com a simplicidade que lhe é caracteristica, que aquilo com eu ando a aprender a viver nos últimos tempos, era possível.
A possibilidade como oposição a algo que nunca poderá acontecer. É possível, dizia-me ela.
Seja com o passar do tempo, com a rigidez da distância ou com o hábito da proximidade. As variáveis são imensas, depende do caso concreto, mas no fim, é possível. "Todos precisamos de um exemplo, e hoje digo-te que é possível".
Quando tudo estiver fechado dentro da caixa onde guardamos as coisas preciosas da nossa vida. Quando o chão da alma estiver seguro de novo. Quando tudo já tiver sido dito, e mesmo que sobre, esse resto já tiver perdido importância. É como a onda que se tenta apanhar em cima da prancha, já passou, não vale a pena pensar mais nisso.
Hoje acordei no meio das palavras que disse ontem e dos sons que ouvi. Entre o que queria dizer e o que não consegui sentir. Ou que senti demais. No fosso que existe entre o que se diz e o que se tem de calar, por não se quer falar demais, por já não valer a pena, não interessar, ser passado.
Escreve Miguel Sousa Tavares, na contracapa do seu novo romance intitulado "No teu deserto" que começei a ler na praia: "Escrever é usar as palavras que se guardaram: se tu falares demais, já não escreves, porque não te resta nada para dizer."
Acho que vou seguir o outro conselho da Rita e vou escrever tudo o que não consegui nem consigo dizer. Antes que as palavras desapareçam. Não há nada mais triste que deixar morrer sozinho o que se sente.
Porque o sol precisa de se pôr, seja para mim, seja para nós. Seja para enfiar na gaveta, seja para partilhar contigo. Porque o sol é igual em todo o lado, independentemente do continente onde se esteja.

4 comentários:

Anónimo disse...

Sofia, tu és uma miuda interessante e inteligente... Embora não te conheça, leio o teu blog, e tb já passei por algumas situações aqui descritas por ti!Não chores, nem lamentes por quem não te merece miuda!! Nem escrevas coisas que sabes que ele vem ler... ÉS DEMASIADO para ele!! E ele é um tótó, que talvez um dia, se venha a arrepender... Talvez sim, talvez não... Mas tu não vais ficar á espera! Beijinhos cheios de força*

Pipoca disse...

E como já estamos em 2010 espero que esta vá já directa para o livro.

Sofia Paixão disse...

Está tudo bem querido anónimo :) It is all alright :) Isto são tudo palavras guardadas, como diz o Miguel Sousa Tavares. Arrependimentos não há, nem deve haver. O que há é viagens pela memória, que todos nós volta e meia fazemos. Porque no fundo, somos todos um bocado tótós :)
Querida Filipinha, maybe...maybe... :)

Isabel Paixão disse...

See há um potencial de tótó dentro de toda a gente, que grande esperança para nós, alunos do técnico. Um dia, todo o mundo será como nós, uma cambada de tótós. Obrigada Caramelo, em nome de todos os tótós deste mundo.